Miguel Dias

Miguel Arcanjo Dias nasceu em Viana no dia 29 de setembro de 1871. Aos onze anos de idade foi encaminhado para São Luís, a fim de ser internado no Colégio Educandos, instituição filantrópica de ensino profissionalizante, voltada à educação de meninos pobres, vindos do interior.

Na escola, o garoto vianense estudaria música e aprenderia vários ofícios, entre eles o de alfaiate. Após concluir o curso, embora tocasse praticamente todos os instrumentos musicais, destacou-se como trompetista, sendo convidado pela direção da casa a fazer parte do grupo permanente de músicos da orquestra do colégio e permanecer, dessa forma, na capital.

Pouco tempo depois, a orquestra do Educandos recebeu um convite para tocar numa festa em Viana, o que propiciou ao jovem músico, depois de longos anos de ausência, o retorno à cidade natal. O baile realizou-se na residência da famosa professora Cóia Carvalho. Enquanto tocava, observou, no salão, uma moça morena de cabelos escuros, encostada próxima a uma das janelas do solar. Na primeira música em que sua participação não era tão necessária, deixou o trompete sobre a cadeira e foi tirar a moça para dançar. Apaixonou-se de imediato pela jovem, que se chamava Mariana Araújo.

Regressando a São Luís, não pensou duas vezes: desvencilhou-se dos compromissos, arrumou suas malas e, de posse do trompete e da máquina de costura, voltou definitivamente à cidade de origem, onde escreveria uma historia singular de competência, amor e dedicação à musica.

Miguel Dias casou-se com Mariana Araújo e tornou-se pai de sete filhos: Odilon, Josefa (Nhazita), Etéldera, Nair, América, Filomena e Odinéia. A todos, procurou passar os ensinamentos básicos de sua grande paixão. O filho mais velho, Odilon, aos sete anos de idade já tocava trompete e, a exemplo do pai, aprenderia a tocar igualmente todos os instrumentos. Entre as filhas, os destaques ficaram com Nhazita (que tocava harmônio), Etéldera (harmônio e violino) e América (violino).

O grande mérito, entretanto, do Maestro Miguel Dias, foi sua notável contribuição à difusão da música vianense. Residindo no velho sobrado da esquina da Praça da Matriz, atualmente em ruínas, o abnegado maestro criou ali uma escola particular de música, por cujos bancos passariam mais de uma centena de futuros músicos da terra. Tornou-se até comum, na época, muitos de seus ex-alunos se mudarem para São Luís, a fim de ingressarem nos quadros das bandas da Polícia e do Exército. Outros discípulos iriam mais longe, levando o nome da música vianense além-fronteiras como, por exemplo, Júlio e Pedrinho Neves, Onofre Fernandes e Dilú Mello.

O mais interessante de tudo isso, é que o abnegado maestro não cobrava nenhum centavo pelas aulas ministradas. Ensinava por prazer e amor à arte. Sustentava-se, e à família, com o salário de delegado e com os recursos obtidos com o trabalho de sua banda e de sua orquestra. Seguia uma rotina organizada: pela manhã, como autoridade policial, realizava as audiências na sala da frente do sobrado; à tarde, o mesmo local se transformava em oficina de música. Pela noite, até as 21 horas, atendia os alunos que necessitassem de reforço, copiava músicas ou consertava os instrumentos velhos.

A competência e o esmero do maestro ganhariam prestígio por toda a Baixada. Dono de um acervo musical riquíssimo, sua orquestra recebia constantes convites para tocar em bailes nos municípios vizinhos. Em Viana, enquanto esteve na ativa, a animação dos largos nas festas religiosas de São Sebastião, São Benedito da Barreirinha, Nazaré e Nossa Senhora da Conceição ficavam ao encargo de sua banda.

Depois de acometido por grave enfermidade cardíaca, provavelmente em decorrência dos exercícios prolongados nos instrumentos de sopro, o maestro Miguel Dias faleceu aos 54 anos de idade, no dia 1º de setembro de 1925. Segundo depoimento de uma de suas filhas, América Dias, seu enterro foi o mais bonito já realizado em Viana. Acompanhado pelas Irmandades do Santíssimo Sacramento (da qual fazia parte) e do Coração de Jesus, pelos estudantes do Colégio do Estado e grande número de amigos, admiradores e ex-alunos, o féretro subiu a Rua Grande em direção ao Cemitério 2 de Novembro  ao som de duas bandas (a sua e a do também maestro Temístocles Lima), que executavam a marcha fúnebre escolhida por ele próprio, antes de falecer.

Por Luiz Alexandre Raposo