“O CARRASCO DO BOI”, por Luiz Antonio Morais

Escultura do boizinho: Nil Muniz

 

Ele já passou o sal
Soprou a brasa, vermelhou sob a grelha, o troféu
De uma noite encantada bem ao léu
De uma fazenda sem dó, de tortura um parto só
Um desejo, um lampejo de um facão
No peito cravejado no ventre, no coração
De um grito uma vingança, uma sina
Ela quer, ela deseja, ela vomita palavrão
Ela quer a carne trêmula do gozo do patrão
Ela é Catirina, ela é fina, ela é mulher
Menina teima, queima a fogueira, um tição
Da fuga do boi, a corda alcança a paixão
Do laço do abraço rebolado, a dança da fogueira
Vaidade cega, brilho da lua
Estrelas, sangue suor a noite inteira
Aguardente, quente, couro quente
Badalos, sotaques, pulsar, é fogo
O couro come, som, dançou, fugiu
A lança do ferrão, no lombo que sangrou
A fera ferida que urrou, ecoou
Na palafita, nos guetos, do terreiro sujo
Na poeira que solta o grito, toada, canção
Matraca, chifre na cabeça é um barbatão
Que chama da janela, a menina apaixonada
Um baiante da noite sem dormir
Com o sol que nasceu da lua, da noite que cair
É um troço é um treco, é amante da brincadeira
É sotaque sem besteira de parir
É toada que maltrata o coração
Até na hora de partir
Já vou m‘ imbora paruano volto aqui
Alma rachada, da noitada e sem tí
Procurando, na pintura do teu rosto
O amor da nativa que perdi
Canto perdido de vaqueiro abandonado
Na porteira, na espera, na espora
No prenúncio da aurora
No sangue do vinho, do ciúme
No gosto do beijo, invasão de língua
Do mimoso eu sentí
No céu da tua alma, mata ele, mata a fome
Ressuscita, faz a festa São João
Traz o santo, traz o terço, faz a oração
Levanta e vai, conquista, encanta
Volta pro teu torrão, corta o sabor
Da língua que essa menina desejou
Meu coração arrebatou
Mas ela chegou pra sempre amor
Pro abraço do carrasco do desejo eterno
Pro abrigo da fazenda, a festa do feitiço
Berra o grito, porque nunca foi, nunca foi, nunca foi…
Ê meu boi!!!
Êêêêêêê Flor Catirina
Catirina Flor
Desce a escadaria
Minha mina,
Sobe a pradaria
Vem pra esta fazenda
Refúgio do meu amor

 

Acadêmico Luiz Antonio Morais

Titular da Cadeira nº 20 da AVL

Patrono: Dom Francisco Hélio Campos

Publicitário | Jornalista | Acadêmico da Academia Vianense de Letras (AVL) – Viana, junho 2020